Enquanto não for aprovado o Orçamento Geral da União, o que geralmente só ocorre em dezembro, os brasileiros vão acompanhar com grande expectativa as negociações em torno da fatia dos impostos que vai bancar a maior parte das campanhas eleitorais de 2022. Afinal, nada menos que R$ 5,7 bilhões foram destinados às despesas de partidos e candidatos no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO), uma espécie de prévia da peça orçamentária federal, aprovado pelo Congresso recentemente.
Esse dinheiro foi reservado ao Fundo Especial de Financiamento de Campanhas (FEFC), o Fundo Eleitoral — ou, simplesmente, Fundão.
Na noite de sexta (20), o Palácio do Planalto distribuiu nota oficial anunciando que o valor foi inteiramente vetado pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, ao sancionar o PLDO, convertendo-o em lei. A LDO de 2022 e os vetos, assim como suas justificativas, só serão publicados pelo Diário Oficial da União nesta segunda-feira (23). O próprio presidente chegou a cogitar a possibilidade de veto parcial desse trecho do projeto, com o estabelecimento de um meio termo entre os quase R$ 6 bilhões aprovados pelo Congresso e os R$ 2,03 bilhões destinados ao Fundão em 2020, mas o veto parcial, nesse caso, é legalmente impossível. O montante alternativo era situado entre R$ 3 bilhões e R$ 4 bilhões, assunto que volta agora à seara parlamentar. A mera correção pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) projetado para 2021 e 2022 elevaria a verba para R$ 2,2 bilhões.
Segundo a Agência Brasil, a Secretaria-Geral da Presidência da República informou em nota que o novo valor do fundo "será definido pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e incluído no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) do ano que vem". O prazo para envio do PLOA pelo Executivo ao Congresso termina em 31 de agosto próximo. De acordo com a nota, para chegar ao novo valor, o tribunal utilizará os "parâmetros previstos em lei".
De forma mais precisa, a verba para o Fundão depende da quantia fixada pelo TSE, mas também de recursos que lhe são atribuídos pelos congressistas na lei orçamentária.
Conforme Augusto Belo, consultor de Orçamento do Senado, como estava no PLDO, o Fundo contaria com sua parcela obrigatória, estimada em R$ 791 milhões, mais R$ 4,93 bilhões, estimativa correspondente a 25% da soma dos orçamentos da Justiça Federal em 2021 e 2022, que seriam remanejados do montante das emendas impositivas ao Orçamento apresentadas pelas bancadas estaduais.
A parcela obrigatória é definida pelo Tribunal Superior Eleitoral e equivale à somatória da compensação fiscal que as emissoras comerciais de rádio e televisão receberam pela divulgação da propaganda partidária efetuada em 2016 e 2017, atualizada monetariamente pelo INPC. O percentual sobre as emendas de bancada é variável — depende do que decidem os parlamentares a cada eleição.
A Presidência, diz a Agência Brasil, "também confirmou que houve veto das despesas previstas para o ressarcimento das emissoras de rádio e de televisão pela inserção de propaganda partidária". Esse veto, entretanto, não tem relação, pelo menos direta, com a verba do Fundo Eleitoral. A propaganda partidária financiada por recursos públicos provenientes do Fundo Partidário foi extinta em 2017. O Fundo Partidário diferencia-se do Fundo Eleitoral por abastecer de forma perene as agremiações, garantindo seu funcionamento administrativo e seu fortalecimento institucional, embora também possa ser utilizado para pagamento de despesas durante as campanhas. (ver mais abaixo)
O que o Congresso fez foi incluir no projeto de diretrizes orçamentárias enviado a Bolsonaro a obrigatoriedade de que as "despesas para o ressarcimento das emissoras de rádio e televisão pela inserção de propaganda partidária" fossem discriminadas — em categorias de programação específica — no Projeto de Lei Orçamentária de 2022, na respectiva Lei e nos créditos adicionais. A propaganda partidária, nesses termos exatos, é objeto de um outro projeto de lei atualmente em exame na Câmara. (ver mais abaixo)
O novo patamar de recursos para o Fundo Eleitoral, portanto, deverá constar do Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) a ser enviado pelo Executivo nos próximos dias e apreciado pelo Congresso até o fim do ano. Do ponto de visa estritamente regimental, os parlamentares têm como alternativa derrubar o veto presidencial aos R$ 5,7 bi ou, de maneira mais prática, simplesmente propor alterações ao PLOA.
No Legislativo, mas também fora dele, o assunto tem gerado polêmica desde que foi a votação no dia 15 de julho, com 278 votos favoráveis e 145 contrários, na Câmara, e placar de 40 votos a favor e 33 contra, no Senado.
A manifestação mais recente foi a do senador Eduardo Girão (Podemos-CE): "O veto ao aumento imoral do fundão é uma vitória do pagador de impostos. O Brasil se mobilizou e o bom senso prevaleceu. O lençol é curto e o país tem outras prioridades. Que os bilhões poupados sejam usados onde o povo mais precisa", publicou o parlamentar em uma rede social. Na opinião dele, "o Congresso tem que manter essa conquista".
Na oposição, o principal crítico do valor aprovado em 15 de julho é o líder do Cidadania, Alessandro Vieira (SE):
“A LDO, novamente, não reflete a necessidade do país, não garante requisitos de transparência e faz uma quase triplicação dos recursos destinados ao Fundo Eleitoral. É desnecessário, é equivocado e é desrespeitoso com as centenas de milhares de vidas que já perdemos e com o tamanho dos investimentos que serão necessários para a recuperação da nossa economia”, disse ele logo depois da aprovação do PLDO.
O senador foi além das críticas verbais e ingressou, na companhia de deputados, com um mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF) contra o aumento do Fundo Especial previsto pelo PLN 3/2021.
Eduardo Girão e Alessandro Viera: aumento do fundo eleitoral ignora prioridades do país (fotos: Pedro França/Agência Senado) |
Integrantes do movimento Livres, outros parlamentares argumentam que a aprovação da verba se deu de forma irregular, já que, segundo eles, não houve tempo razoável para deliberar sobre mudança tão expressiva. A ação, que será relatada pelo ministro Kassio Nunes Marques, foi assinada pelos deputados federais Adriana Ventura (Novo-SP), Daniel Coelho (Cidadania-PE), Felipe Rigoni (PSB-ES), Tabata Amaral (PDT-SP), Tiago Mitraud (Novo-MG) e Vinicius Poit (Novo-SP).
“São R$ 5,7 bilhões que poderiam ser investidos em programas como o auxílio emergencial, e agora serão desperdiçados com campanhas eleitorais. Vergonha”, escreveu Vieira em suas redes sociais, a propósito do aumento não só inaceitável, mas inoportuno, principalmente pelo fato de o país estar enfrentando a pandemia da covid-19. Esse aspecto foi igualmente mencionado pelo senador Plínio Valério (PSDB-AM), que demonstrou preferência por aumento de verba para áreas como educação e geração de emprego e renda.
O líder do Podemos, o senador Alvaro Dias (PR), foi outro que criticou a aprovação veloz do projeto da LDO. Entre o exame na Comissão Mista de Orçamento (CMO), a inserção do aumento do fundo eleitoral no Plenário da Câmara e aprovação final da matéria não se passaram nem 24 horas.
“Já projetos exigidos pela sociedade, como o fim do foro privilegiado e a prisão após condenação em segunda instância, são sistematicamente boicotados e mofam nas gavetas. Não é um absurdo essa inversão total de prioridades? O apelo que fazemos ao presidente da República é para que ele vete o aumento do fundão eleitoral para 2022”, postou Alvaro nas redes sociais.
Na opinião do senador Reguffe (Podemos-DF), o acréscimo do fundo eleitoral é “um tapa na cara do contribuinte honesto brasileiro”. Seu companheiro de partido, o senador Styvenson Valentim (RN) disse lamentar que a elevação da verba eleitoral se dê às custas da qualidade dos serviços públicos e beneficie principalmente os dois maiores partidos políticos — o PT e o PSL.
Fonte: Agência Senado
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